Nas últimas décadas do Século XIX, extinguia-se na Europa o entusiasmo despertado pela Revolução Francesa, e procurava-se reformular a ordem social e política. O recém-unificado Império Alemão intencionava suprimir a Igreja Católica, negando a fé em nome da ciência, do pensamento livre e do progresso. Este é o período da “luta pela cultura” (Kulturkampf), o conflito entre o Estado Alemão e a Igreja Católica, iniciado em 1871. Durante os últimos 6 anos da sua vida, Madre Francisca enfrentou essa dura realidade, dando testemunho às suas Irmãs como mulher de oração, profunda fé, determinação e coragem.
Em janeiro de 1871, o primeiro ministro da Prússia, conde Otto von Bismarck, havia unificado o Império Alemão, até então dividido em 25 estados, e proclamado o Rei da Prússia como Imperador Guilherme I.
Bismarck, tornado príncipe e chanceler do Império, defendia a Igreja Nacional e combatia acirradamente a Igreja Católica. Naquele mesmo ano, o Império Alemão dissolveu a repartição católica do Ministério da Cultura, dando início à sua “luta pela cultura”.
No ano seguinte, os jesuítas foram expulsos do país e vários bispos católicos tiveram seus direitos restritos. O bispo de Ermland, Phillip Krementz, foi condenado a prisão domiciliar e os bispos Paul Melchers, de Colônia, e Miecislas Halka, conde de Ledochowski, de Gnesen-Pose, foram multados e presos por terem protestado contra as restrições governamentais.
Em 1873, o Império Alemão promulgou as “Leis de Maio”, criando um tribunal civil para controlar assuntos referentes à Igreja Católica. Essas leis baniram todas as congregações religiosas no país, exceto as dedicadas ao serviço de enfermagem.
Madre Francisca começou a preparar suas Irmãs para um período de maiores sacrifícios, sofrimentos e perigos, refugiando-se no único lugar seguro que tinham: o coração de Jesus. Ela enviou orações especiais para todas as comunidades orarem e, na Quaresma de 1874, voltou a reforçar esse apelo, temendo que o governo assumisse o controle da Congregação. Sua suspeita se tornou realidade quando a polícia exigiu os nomes de todas as Irmãs, inclusive as Noviças, tanto na Casa-Mãe como no Convento Dominicano que ocupavam, em Aachen. Ela já estava percebendo que esse decreto seria o primeiro controle estatal, entre vários outros, sobre a Congregação.
Por duas vezes as eleições congregacionais foram adiadas, mas em 1875 o Arcebispo Paulo Melchers recomendou que uma eleição fosse realizada antes que a Congregação tivesse que enfrentar condições ainda piores. Contrariamente à sua vontade e fragilidade, Madre Francisca foi reeleita e imediatamente escreveu ao arcebispo pedindo que não aprovasse o resultado daquela eleição.
Mas ele respondeu por carta: “Venerável Madre Francisca, Neste momento de severas provações e tribulações, a Sra. não pode recusar a escolha que recaiu novamente sobre si. Essa é a minha completa convicção e meu desejo. Deus há de ajudá-la. O que a Sra. diria a um pastor que estivesse para abandonar o seu rebanho na hora em que estivesse sendo assaltado por um ladrão? Deus esteja consigo.” Obediente, Madre Francisca acolheu a decisão do arcebispo como uma expressão da vontade de Deus.
Em 1875 novas leis anticlericais concederam ao governo alemão autoridade para confiscar todas as propriedades da Igreja Católica. Sentindo que a Congregação estava prestes a ser banida do país, Madre Francisca enviou três Irmãs aos Estados Unidos para explorar a possibilidade de mudança para lá, chegando inclusive a solicitar a um amigo de um primo que comprasse a Casa Mãe para protegê-la do controle do governo. Compraram então uma casa em Bergen Enkheim, perto de Frankfurt, para hospedar temporariamente as Irmãs idosas e doentes, designando Irmã Kunigunde como superiora. Prevendo que a Congregação não teria mais condições de subsistir na Alemanha, Madre Francisca decidiu mudá-la para a Bélgica, com o suporte de suas Conselheiras, e construir uma nova Casa Mãe, em Andrimont, na Bélgica.
No dia 1º de julho de 1875, o Ministro da Cultura da Alemanha, Adalberto Falk, chegou à Casa Mãe exigindo que Madre Francisca mandasse embora as estudantes pobres que moravam com a Congregação e que as Irmãs parassem de mendigar na cidade. Madre Francisca respondeu: “Com os resultados das coletas cobrimos os custos das cozinhas da sopa dos pobres e dos doentes, criadas e mantidas pela Congregação. Esta proibição implica no seu fechamento e, consequentemente, os pobres e os doentes serão severamente afetados por ela.” Falk protestou, e Madre Francisca calmamente respondeu: “Se as nossas atividades devem ser restringidas desta maneira na nossa pátria alemã, somos forçadas a nos mudarmos para os Estados Unidos, ou para algum outro país.” Falk recuou e Madre Francisca declarou: “Em primeiro lugar, somos religiosas. Somente em segundo lugar, somos enfermeiras. Se o Estado quiser interferir nos assuntos internos da nossa vida religiosa, desistiremos da enfermagem e abandonaremos o país. Prefiro colocar minha cabeça no patíbulo, assim como qualquer uma de nós, do que desviar um milímetro da nossa integridade.” O Ministro Falk deu de ombros e foi-se embora, derrotado.
Pouco depois, Madre Francisca recebeu uma carta do governo exigindo detalhes sobre a vida externa e interna da Congregação. Ela respondeu a todas as perguntas sobre o aspecto externo, mas nada sobre o aspecto interno. E em carta anexa, declarou: “Um questionário que me foi enviado para ser preenchido tem, sem dúvida, o objetivo de servir de base para o controle da nossa Congregação por parte do Estado. Inclui perguntas que despertam o temor de que a supervisão do Estado não nos permitirá a livre disposição dos nossos meios de subsistência e o livre missionamento dos membros da Congregação, consequentemente restringindo nossas atividades e até mesmo as abolindo. O caráter religioso da noss Congregação sofrerá particularmente com isso.
Enquanto essa percepção das nossas direrizes não for corrigida, sinto muito, mas não posso preencher esse questionário.
Aachen, 20 de julho de 1875, Francisca Schervier, Superiora Geral das Irmãs dos Pobres de São Francisco.”
Durante esses tempos difíceis Madre Francisca apelou para a Imperatriz Augusta, mulher do Imperador Guilherme I, a quem conhecia. A imperatriz intercedeu a seu favor e tanto as exigências do governo como sua perseguição às congregações femininas diminuíram. Somente a proteção da imperatriz Augusta impediu o exílio da Congregação e de outras ordens religiosas dedicadas a serviços de enfermagem. Apenas gradualmente a “luta pela cultura” foi cedendo e a Congregação pôde dar continuidade às suas antigas atividades nas comunidades e voltar a admitir novos membros.